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Artigo: Análise cinemática da impulsão e aterrissagem do bloqueio de atletas amadoras de voleibol

Introdução

    O salto vertical é um movimento amplamente utilizado em várias modalidades esportivas. A exemplo do voleibol, por sua repetitividade, freqüentes são as lesões nos membros inferiores dos atletas.

    Especificamente no voleibol, 15 a 60% das lesões que os atletas são acometidos ocorrem em nível de no tornozelo, na faze de aterrissagem (BRINER JUNIOR e KACMAR, 1997) e, as contusões mais comuns após o bloqueio acontecem por supinação e no ataque por inversão (BRINER JUNIOR e BENJAMIN, 1999). Ainda, consecutivas lesões no segmento tornozelo, acabam ocorrendo por causa de instabilidade, ruptura de ligamento, dor o tornozelo e outras (CHIAPPA, 2001).

    A instabilidade do tornozelo e a entorse são comuns em voleibolistas porque esta modalidade é muito intensa e possui longa duração, colaborando com essas contusões; um dos motivos mais comuns da instabilidade do tornozelo são as várias entorses ocorridas nos desportistas do voleibol, no momento das aterrissagens dos saltos (GROSS e MARTI, 1999).

    Em um estudo realizado por Santos et al. (2005) detectaram níveis médios de impactos na aterrissagem dos bloqueios de 33,26 g, e que os atletas repetem em média 26 vezes o gesto por treino. Por outro lado, tendo em vista o nível técnico da equipe, mesmo que o número de lesões do grupo tenha sido maior no tornozelo, não se encontrou associação significativa entre número de impactos com as lesões. Já outros autores apontam que os saltos do voleibol correspondem a 63% das lesões (BRINER JUNIOR e KACMAR,1997).

    Mesmo que a maioria dos estudos aponte as causas de acometimentos de lesões nas extremidades baixas, principalmente os tornozelos, na sua grande maioria, seja pela repetitividade da prática, um dos fatores que está diretamente ligado ao acometimento ou não, é a técnica utilizada para o amortecimento dos saltos. Aterrissagens com técnicas apropriadas podem reduzir significativamente os impactos e assim os riscos de lesão, dependendo do ângulo da articulação do joelho no momento do primeiro contato (STACOFF et al., 1988) e da flexão plantar do pé (VALIANT & CAVANAGH, 1985; GROSS & NELSON, 1988).

    Deste modo, partindo do pressuposto que a técnica adequada pode contribuir para a redução do número de lesões é que se realizou este estudo, com o intuito de realizar a análise cinemática do movimento dos membros inferiores durante a impulsão e aterrissagens do bloqueio de atletas amadoras de voleibol. Mais especificamente objetivou-se identificar os ângulos de quadril, joelho e tornozelo no momento de impulsão e aterrissagens; associar os ângulos de quadril, joelho e tornozelo no momento de impulsão e aterrissagens com a massa e a estatura das atletas; associar a impulsão vertical (teste) com a impulsão vertical medida em situação real (bloqueio) e por fim comparar os ângulos de flexão da impulsão com os ângulos de flexão na aterrissagem.


Materiais e métodos

    Este estudo caracterizou-se como uma pesquisa descritiva, da qual participaram 8 atletas amadoras de voleibol, escolhidas de forma intencional, por serem as que mais apresentaram lesões nos membros inferiores nos últimos dois anos.

    Como instrumento de medida utilizou-se: uma balança da marca Filizola com precisão de 100 g; uma toesa com precisão de 0,10cm; o teste de impulsão vertical e o sistema SPICAtek®.

    As medidas foram realizadas no Laboratório de Biomecânica da Universidade Federal de Santa Catarina, após agendamento antecipado, as atletas foram informadas dos objetivos da pesquisa e assinaram o consentimento orientado.

    As medidas antropométricas de estatura e massa foram obtidas de acordo com os protocolos citados por Alvarez e Pavan (2003). O teste de impulsão vertical foi realizado de acordo com o Vertical Jump (JOHNSON e NELSON, 1979).

    Para a mensuração das variáveis angulares de tornozelo, joelho e quadril do movimento de impulsão e aterrissagem do bloqueio, utilizou-se o sistema de reconstrução tridimensional de movimento Digital Motion Analysis System (DMAS) 5.0 da SPICAtek®. Este sistema é composto por 4 câmeras filmadoras digitais, da marca DALSA - CCD Image Capture Technology / CA-D4, com resolução de 1024x1024 pixels, com fator de correção de 1:1 à 40 quadros por segundo (fps).

    Para reconstrução tridimensional do movimento o sistema DMAS 5.0 utiliza o método Direct Linear Transformation (DLT). Este procedimento utiliza para a obtenção das coordenadas espaciais (x, y e z), os pontos de controle ou de referência anatômicas fixados previamente no sujeito, antes da realização do experimento de interesse. Para a calibração do sistema utilizou-se o calibrador do sistema Peak Motus® (Accessories Manual Peak Performance Technologies Inc.), este composto por 25 pontos, não-coplanares, distribuídos no espaço determinado para a realização dos movimentos de interesse. As imagens foram capturadas por três câmeras, que não foram reajustadas ou movimentadas durante todas as aquisições.

    Os dados cinemáticos do bloqueio foram obtidos através da digitalização dos pontos de interesse (acrômio, trocanter maior do fêmur, côndilo femural lateral, maléolo lateral, cabeça do segundo metatarso - Figura 1), demarcados nos sujeitos com pontos reflexivos para representar os respectivos eixos articulares. Nesse sentido, para minimizar os possíveis erros de digitalização foi utilizado o filtro digital Least Square Fit, disponível no próprio sistema. O filtro integra o sistema DMAS 5.0 SPICAtek® e opera de forma automática com uma freqüência de corte estabelecida em 3 Hz.


    Os dados foram tratados mediante estatística descritiva em termos de média desvio padrão e coeficiente de variação, e estatística inferencial através do teste "t" de Student para dados pareados a p£0,05, bem como com a utilização da Correlação de Pearson.


Resultados e discussão

    O grupo de atletas amadoras de voleibol apresentou média de idade de 19,25±1,58 anos com coeficiente de variação (CV) de 8,21%; massa corporal de 63,09±5,1 Kg com CV= 8,08% e estatura de 1,69±5,9 m com CV= 34,91%. O grupo apresenta, segundo tabela de Gomes (1990) baixo nível de variabilidade, ou seja, um grupo homogêneo quanto a massa corporal e a idade, porém heterogêneo (variabilidade muito alta) com relação a estatura.

    Com relação ao teste de impulsão vertical as jogadoras apresentaram uma impulsão de 0,38±0,06m CV= 152,63% e quanto a impulsão no bloqueio, obtida por meio da digitalização das imagens as jogadoras obtiveram uma impulsão de 0,36±0,04 m CV= 36%. Os índices de variabilidade obtidos para essas duas variáveis indicam que o grupo apresenta um nível técnico heterogêneo.

    Quanto aos dados referentes ao teste de impulsão vertical, a impulsão vertical no bloqueio e aos ângulos de quadril, joelho e tornozelo no momento de impulsão e aterrissagens, podem ser observados no Quadro 1.


    De acordo com o quadro 1 verifica-se que os maiores ângulos na preparação (105,13o), no 1o contato com o solo (161,40o) e na aterrissagem (149,52o) mostraram-se na articulação do quadril. Por outro lado os menores ângulos obtidos foram na articulação do tornozelo (71,62o; 100,98o; 76,35o, respectivamente).

    Com vistas a literatura pesquisada, não se encontrou descrição efetiva dos ângulos máximos de flexão tanto na preparação quanto na aterrissagem do salto. Porém, obteve-se dados com referência aos ângulos do 1o contato com o solo apenas do tornozelo, cujo os dados variaram de acordo com os grupos pesquisados, entre 121,3º a 127,5o (FANTINI e MENZEL, 2003), os quais são maiores que os obtidos neste estudo, sendo que no estudo dos autores citados a amostra foi composta por atletas profissionais.

    Na tentativa de verificar a relação entre as variáveis do estudo, inicialmente relacionou-se a estatura com os ângulos máximos de flexão do tornozelo, joelho e quadril na impulsão para o bloqueio, aplicando-se uma Correlação de Pearson (r=0,52; r=0,58; r=0,19, respectivamente), encontrou-se uma correlação moderada com o quadril e joelho e uma fraca correlação com o tornozelo.

    Quanto a relação entre estatura e ângulo máximo na aterrissagem, também se aplicando uma Correlação de Pearson (r=0,45 para o tornozelo; r=0,56 para o joelho; r=-0,27 para o quadril), só encontrou-se relação moderada para o segmento quadril. Este fato pode ser justificado pelo fato que quanto mais alta a jogadora, menor é a altura do salto necessária para a realização do bloqueio, e conseqüentemente menor é a flexão necessária para amortecer a queda.

    No que concerne a relação da massa corporal com os ângulos dos segmentos no momento da impulsão para o bloqueio, só encontrou-se correlação moderada no segmento tornozelo (r=0,51). Por outro lado, na relação massa corporal com o ângulo na aterrissagem encontrou-se correlação moderada negativa (r=-0,76) com o segmento corporal quadril. Justifica-se a correlação moderada negativa tendo em vista que quanto maior o peso do atleta, maior a solicitação do ângulo do quadril para o amortecimento da queda.

    Verificou-se a relação entre a impulsão no teste vertical com a impulsão no bloqueio, para a qual obteve-se correlação moderada (r=0,67).

    Para a comparação dos ângulos de flexão da impulsão com os da aterrissagem, utilizou-se o teste "t" de Student para dados pareados a p£0,05, encontrou-se diferença significativa entre os ângulos do quadril (tc=-6,84) e do joelho (tc=-3,60), no entanto não houve diferença significativa para os ângulos do tornozelo (tc=-1,16). Misuta et al. (1999) também encontraram diferença entre os ângulos do joelho no momento da impulsão e aterrissagem. Essa diferença, segundo os autores supra citados, influenciam na posição do centro de massa, que é definida pela posição relativa entre os segmentos, e uma maior flexão de joelhos no momento de aterrissagem significa um rebaixamento da posição do centro de massa, este fato contribui para a manutenção do equilíbrio. Por outro lado, quanto maior o a flexão das articulações, maior será a dificuldade de retorno à posição para novas ações em jogo.

    As correlações baixas e até mesmo as moderadas, ratificam as interferências do ambiente laboratorial, mesmo que se tenha tentado controlar ao máximo as variáveis de interferência, assim como o baixo nível técnico das atletas.

    Conforme se pode observar nos gráficos 1, 2 e 3, o comportamento angular descrito nas curvas das três articulações analisadas são semelhantes, apenas havendo variações quanto a amplitude angular de cada uma. O comportamento angular destas curvas podem ser descritos da seguinte maneira: partindo de uma posição neutra das articulações (posição de pé), é iniciada uma flexão (preparação para o salto), seguida de uma extensão (impulsão para o salto) e uma flexão (amortecimento da queda após o salto), por fim novamente é realizada uma extensão até a retomada da angulação característica da posição de pé. Comparando estas curvas com dados da literatura, o comportamento angular da articulação do joelho mostrou-se muito próximo aos resultados de Misuta et al. (1999) em um estudo com praticantes amadores desta modalidade. As curvas de tornozelo e quadril não puderam ser discutidas devido ao fato de não terem sido encontrados dados compatíveis na literatura consultada.





Conclusões

    Com base nos resultados obtidos e respeitando as limitações do estudo, conclui-se que:

  1. o grupo de atletas é homogêneo quanto a massa corporal e a idade, porém heterogêneo quanto a estatura e nível técnico;

  2. parece que os ângulos de quadril e joelho durante a impulsão tem relação com as estaturas das atletas na medida que quanto maior a estatura maiores os ângulos, assim como a estatura influenciou no ângulo do quadril na aterrissagem;

  3. parece que a massa corporal influencia o ângulo do tornozelo no momento da impulsão, na medida que quanto maior a massa maior o ângulo da articulação, por outro lado, quanto menor a massa corporal maior os valores do ângulo do quadril no momento da aterrissagem;

  4. o desempenho das atletas obtidos no salto vertical foi proporcional ao desempenho durante o salto no bloqueio;

  5. as solicitações das articulações do quadril e do joelho diferenciam para o movimento de impulsão e aterrissagem do bloqueio.

    Por fim, este estudo teve a finalidade de descrever o fenômeno estudado, buscando contribuir tanto para a perfomance quanto para a prevenção de futuras lesões do grupo.


Referências bibliográficas

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Autores:

Dra. Saray Giovana dos Santos  
Guilherme Coelho  
Diogo Cunha dos Reis
saray@cds.ufsc.br




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